domingo, 2 de fevereiro de 2014

Novo filme de Carlos Pronzato retrata o espírito das Jornadas de Junho

Da redação de Giro à Esquerda


Carlos Pronzato, renomado documentarista argentino que há vários anos reside no Brasil, lançará em breve um novo documentário: "A partir de agora: as Jornadas de Junho no Brasil", que tenta captar os diversos aspectos que permearam em 2013 a maior onda de manifestações de massas desencadeada no país nos últimos 20 anos.

O documentário mescla imagens das grandes marchas com depoimentos de ativistas e militantes das mais variadas matizes políticas, colhidos por Pronzato durante viagens realizadas após os protestos por várias regiões do país.

Pronzato é conhecido internacionalmente pelo engajamento político de suas produções, que sempre buscam retratar a realidade desde o ponto de vista da classe trabalhadora e suas organizações. Dentre as obras mais conhecidas estão "Madres de Plaza de Mayo - Memoria, Verdad y Justicia", "Carlos Marighella - quem samba fica, que não samba vai embora" e "A Revolta do Buzú".

Recentemente o cienasta produziu em Belo Horizonte o rico documentário "Dandara - Enquanto Morar for um Privilégio, ocupar é um direito", que conta a história e os obstáculos enfrentados por uma das maiores ocupações urbanas da região.

Curta a página no Facebook e assista abaixo o teaser
de "A partir de agora: as Jornadas de Junho no Brasil":

Conheça a história de J. F. Neres, vereador cassado em Sabará por ser comunista

Publicado originalmente no site do PCB.

José Francisco Neres, conhecido durante a clandestinidade na ditadura de 64/85 como Pinheiro, ou, para todos nós, simplesmente o camarada Neres, foi o último preso político a ser posto em liberdade em Minas Gerais.

Neres foi vereador em Sabará, e foi cassado não pelo governo federal ditatorial, mas pela própria câmara municipal de Sabará, que se aproveitou do golpe para tirar o mandato conseguido nas urnas.

Em 2012, décadas depois da covardia legislativa, a câmara em sessão solene devolveu simbolicamente o seu mandato.

Neres está produzindo um documento sobre suas vida e sua luta. Abaixo, reproduzimos trecho dessa obra. Sabará também tem seus heróis, abnegados na resistência à ditadura empresarial/militar. Boa leitura!


"Interrompe-se bruscamente o sol; das flores só o cheiro cada vez mais distante. Da música os acordes mais dissonantes, depois estridentes até desaparecerem os acordes; a melodia foi vencida.

Resta o barulho ensurdecedor tentando ofuscar a lembrança, as vozes de crianças, as vozes do povo, as vozes do novo, o barulho contra o grito.

Gritos, urros, homem contra máquina de dor, a máquina contendo refinada tecnologia, manejada com arte sinistra.

Homem no escuro, o ar cada vez mais fragmentado. Sombra da noite, enfim a noite. As asas do pássaro o carregam para a noite.

Mas não... é proibido anoitecer. Aqui também a medicina tem seu lugar, encobre a noite mas reforça a escuridão.

Nos raros intervalos em que se pode lembrar, explode o canto novo. É preciso ocupar todas as horas do dia, todos os dias da noite. Som, barulho, dança macabra, onde o velho e o filho bastardo descarregam sua ira como que vingando sua decadência.

Como pode o passado se atirar com tanta força contra o presente e o futuro? O velho foi ferido de morte em 1917. De lá para cá sobrevive sugando força de sua filha bastarda - a classe média - e se alimentando da bestialidade, do obscurantismo que também são subprodutos do velho.

Agora a dança é mais feroz; não conta horas. O dia se perdeu, o ar ficou mais escasso, os combustíveis para vida foram cortados. Em lugar o seu terror, o delírio, as alucinações; o encontro com a noite se faz urgente antes que se apague da mente as cores, as lembranças e a força do novo.

Até a noite foi acorrentada, passou a ser jogada contra a escuridão. A força nova se mantém por um fio, comprida, reprimida. Momentos de refluxo: momentos em que o velho se impõe e festeja a vitória que antevê.

Mas, um rasgo de sopro passa pelo fio e arromba a janela. Impõe de novo o novo, a lembrança, de novo a herança, e lá fora se distingue a cor vermelha, a tocha de luz que avança nas mãos da classe operária."


(Pensamento passado para fora da prisão por Neres clandestinamente, no mês de Junho de 1976.)